OS PORTUGUESES (1)

23.5.14
[morada d´os portugueses]
Emérito - Em Braga um homem chegou aos 91 anos e morreu. Dois dias mais tarde haveria um caixão com o cadáver, pousado nas lajes da Sé. Rezar-se-ia uma missa, escutar-se-ia o coro, divino, e uma homilia a louvar o morto. Arcebispos e civis juntaram-se em grande número no enterro. Talvez fossem duas horas mais tarde quando levaram dali o caixão e o puseram no lugar próprio dos homens da sua condição. Fim deste homem.
À mesma hora, mas do lado de fora da Sé de Braga, na rua Dom Paio Mendes, feirantes sem clientela e as suas barracas defendiam-se como podiam do dilúvio. Era suposto que um homem estivesse a ir para céu naquele momento, de acordo com as leis da igreja,  mas não era de esperar o que o céu em fins de maio mandasse tanta água embora. Por fim acabou uma coisa e outra, o funeral e a chuva. Manteve-se o preço das cerejas: três euros o quilo.

E por falar em cerejas … no carro, de regresso a Matosinhos, alguém com nome de campanha religiosa cantou qualquer coisa sobre olhos vermelhos.

CAFÉ ANTUNES

22.5.14
O António escapou-me por entre os dedos e foi cair ao lado do Nespresso, como devem cair os Antónios, mantendo a mesma cara que tinha antes do trambolhão. Veio aqui a Matosinhos (e tem ido a todos os lugares), nesta quinta-feira, contar que da janela viu uma mulher tirar roupa da corda. Poucos se atrevem a começar a frase pela corda e mais nenhum consegue meter a chuva na prosa sem molhar a palavra. Enxuto, o António está quase em condições de começar um livro e escreve a crónica a fim de habituar a mão ao papel.


COME ARMAGEDDON

20.5.14
Entretanto alguém se esqueceu de fechar o manicómio. É por estes dias figura de maior culto humorístico nacional um assassino que matou duas mulheres e se escondeu. A polícia nem pelo cheiro a morte lá vai, e ele, estando lá onde estiver, já esteve com a cara no banco de suplentes do Benfica, na caderneta de cromos do mundial de futebol, com a camisola Portugal, em conselhos de ministros, até já meteu o focinho no meio do Ronaldo e da Irina, ganhou um globo de ouro. E brincar com o caralho, não?

A EXUMAÇÃO DE UM JOGO DE FUTEBOL

12.5.14
foto hdscreen.me































Esta madrugada sonhei com a parte de dentro do corpo. O sonho veio a uma hora em que o jogo de futebol da véspera já estava morto. O sonho veio pelo ombro esquerdo, levantou-me a pele da omoplata (há quem lhe chame escápula) e levantou-me a carne. Vi folhas de alface no lugar dos pulmões, que se moviam como as algas no fundo do mar, e vi ervilhas cor de laranja. Não vi mais nada. Entretanto o sonho foi-se embora do corpo. Antes de sair passou pela língua e falou com ela. Perguntou-lhe porque foge tanto da cabeça, de longe a longe.  A língua mordeu a língua, evitando mandar o sonho para o caralho.

CRÓNICAS DA RUA DO MAR (3)

6.5.14


Este domingo, pelo fim da manhã, na última rua do mundo, os fregueses lá apareceram em maior número para tomar café com sol. A lotação da Aguda esgotou no intervalo de duas ondas. Umas ciganas tentavam vender sapatos feios e ainda bem que a polícia entretanto chegou. Ninguém quer ver pés assustadores em lado nenhum, muito menos no lugar onde a terra acaba e o mar começa.

Os jornais é que ganham com os domingos e com os domingos luminosos nem se fala. Em cada mesa pelo menos um habitante lia qualquer coisinha sobre o dia anterior. Nos jornais ainda não se lê muito sobre o futuro. É bom sinal, porque a verdade ainda não tem amanhã. Melhor lidam as notícias com o pretérito, e às vezes, quanto mais pretérito, melhor. Mais tempo, melhor texto, informação superior. Boas contas ao tempo fez neste domingo a Revista 2. É sobre as idas ao bacalhau e os portugueses que por lá ficaram.

O AMOR PRECISA DE UM PÉ DIREITO

3.5.14
O amor precisa de um pé direito.
Appelbaum amou durante poucos quilómetros e foi logo logo trocado por um amor com mais cavalos, arrebatador.

Tudo o que precisa saber, nesta ligação: APPELBAUMBLOG


E O CABELO, ESPANTADO, ESPANTADO

2.5.14
Appelbaum e as mãos da parteira à espera da cabeça dele, ao fundo da mãe, no bloco operatório.
A vida acontece, em APPELBAUMBLOG.



O DICIONÁRIO DE INGLÊS É UM MACACO

2.5.14
Procurar a definição de blur no dicionário inglês. Encontrar. Blur significa smudge. Não chegar lá, ao esclarecimento. Ver que smudge significa smear. Ficar na mesma. Continuar. Smear é daud. Daud pode ser blob. E blob? Blob quer dizer splotch. Splotch é intraduzível numa única palavra. É como Blur.

FUMADORES. E UMA IMAGEM

1.5.14
"De tudo isto tomou consciência o avô às três por quatro da manhã num tugúrio frequentado por estivadores e marinheiros de transatlânticos enferrujados. Havia poucas horas estivera montado numa loira desenhadora de pontes e de problemas, um anzol dourado, que o avô mordera julgando estar a comer juventude e a rejuvenescer. A verdade dos factos tinha outro gosto. Afinal dera dentadas na morte, experimentara o sabor do seu próprio fim."
no livro FUMADORES


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