MEMÓRIAS DA CATALUNHA

3.6.14
O avião, lápis que desenha viagens no céu, não risca nada em terra.
Barcelona está lá em baixo, feita à mão, e eu, que já não a via desde aqueles dois voos entre Lisboa e Lviv, e entre Lisboa e Donetsk, durante os quais  li a Cidade dos Prodígios, do Eduardo Mendoza, voltei a sentir que a tinha ali debaixo dos pés, à espera de acontecer.
Em Barcelona eu podia ser casa. Eu podia fazer como as árvores, furar o chão, ser a raiz de mim próprio. Há-de ser do chão, pó do meu pó. Sei que é assim. Nunca o saberei explicar em melhores modos.
Barcelona come o que eu comeria todos os dias. Bebe o mesmo malte, as mesmas uvas. E até o sol que ela tem é da cor do meu. Entretanto, tiremos a cabeça do ar, aterremos de barriga no asfalto de El Prat. As rodas pousam e deixam o resto do trabalho às pernas. Andemos do avião para fora, a vida que eu não tive está do outro lado da porta, ao fundo das escadas.
Entro na cidade como estivesse a entrar nas minhas próprias veias, a viajar no meu sangue e nascer do nada, como da outra vez, em 1974, era março e era Vila Nova de Gaia.
Encontrei na segunda noite a música que mexe com as raízes da minha pessoa. E as palavras que a música canta. Dancei, saltei, devo ter semeado lágrimas em frente ao palco. Concertei-me.







Sem comentários:

Enviar um comentário

AddThis