O homem que engoliu uma cassete absurda

23.10.14





















De mal com a vida, pouco lhe corria de feição, enfiou um lápis no olho esquerdo e puxou a fita atrás. Grato pela oportunidade, nem todos podem começar de novo, pensou, e é melhor agradecer enquanto é tempo, quis agradecer, mas a língua era repetitiva, castanha, a sua memória media sessenta minutos, e quando quis agradecer, não o conseguiu fazer, e então em vez de serem quatro, voltaram a ser três da tarde, a essa hora nenhuma segunda oportunidade tinha havido, pelo que a gratidão caiu do tempo, deixou de fazer sentido.

Eram de novo três horas, da tarde, a memória começava a andar para a frente, nascia, crescia, e o homem,  o homem existia, play, parava, pause, guardava para si o barulho do pardais, a voz cansada do rio mais velho da cidade, rec, e, de mal consigo próprio pela perda de tempo, desatava a correr, queria chegar a tempo ao futuro, fast-forward, ao fim. O que mais lhe custava era ter de pedir um nova oportunidade, rewind, e ele, assim, tímido e só, enfiava o lápis no olho esquerdo, calava-se, sem nunca chegar a dizer... obrigado.

Depois do Porto,

21.10.14













em Matosinhos, os portuguesinhos que muito prezam os animaizinhos, mas que por extrema infelicidade dedidem cagar com o cu dos cães, enchem a rua de merda, e  esta, onde as árvores declinam e os carros a afunilam, esta cujo nome vem com um Conselheiro na ponta, esta cheira mal para caralho, por mais que as senhoras caminhem pose, cão, trela e estatuto social.

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